quinta-feira, 22 de abril de 2010

HISTÓRIA DAS ROSAS VERMELHO-NEGRAS

HISTÓRIA DAS ROSAS VERMELHO-NEGRAS
AYRES KOERIG
Havia naquela cidade denominada Santa Maria das Graças, u’a moça bonita e prendada por nome de Maria das Mercês que era considerada como “pau para toda obra”, pela sua conduta para o que “desse e viesse”.
Nas Festas de Natal e mesmo em outras como as da Padroeira, Maria das Mercês, a Neneca, como chamavam-na seus familiares e amigos, era a que encabeçava os preparativos dos eventos. Não tinha preguiça e era de uma criatividade fora do comum. Neneca jamais se queixou de alguma das suas companheiras ter feito “corpo mole” nos preparativos dos acontecimentos. Na sua índole não havia reclamações, mas idéias para serem discutidas; agia sempre democraticamente. Ninguém a criticava; jamais dera motivos para isto e rechaçava fofocas.
Certa ocasião enamorou-se de um rapaz por nome Tony, esbelto e muito cortês no seu linguajar, de quem teve uma filha que recebera na pia batismal o nome de Nereida, em homenagem à ninfa dos bosques.
Tony negou-se em assumir a paternidade da menina.
Neneca criou-a com todo o carinho, embora mãe solteira.
Antes da natividade aconselharam-na que praticasse o aborto, mas, como temente a Deus não aceitou tal prática. Lembrou-se que havia lido e decorado um soneto e, em voz alta recitou-o:
MÃE SOLTEIRA

Quando me lembro fico estarrecida,
Co’aquele diabólico projeto,
Que concebi só pra roubar sua vida
No tempo em que você era simples feto!

Hoje que eu passo sempre recolhida,
No fundo deste leito, mas co’afeto,
Seu coração me dá sempre guarida...
Quão bom isto é para mim, eu ter um teto!

Você proporcionou-me eterna aurora,
Fanal divino que me trouxe ao porto;
Pedir-lhe o seu perdão, venho nest’hora

E agradecer a Deus pelo conforto...
Quem me estaria dando ajuda agora,
Se fosse efetuado aquele aborto?!

Os primeiros meses depois da licença gestação foi um Deus-nos-acuda, porém conseguiu superar este impasse, colocando a menina numa creche, e trabalhando somente meio período na fábrica de confecções de camisas do seu primo Jorge.
Todos os dias ao meio-dia, quando saia da fábrica, passava na creche e levava Nereida para casa de sua mãe, onde também morava.
Os dias corriam e a menina crescia, mimada por todos os que com ela conviviam naquela residência de gente humilde, porém honesta.
No seu primeiro aniversário, Nereida recebeu uma bela festa, patrocinada por Jorge e esposa seus padrinhos. Recebeu destes e dos demais convidados alguns presentes, mas, o que mais gostou, foram os balões coloridos que enfeitavam o teto do local onde se comemorava o evento.
Assim foi se passando o tempo e aos sete anos já cursava o segundo ano primário do colégio onde a haviam matriculado. Crescia a menina em sabedoria e beleza quando, ao dirigir-se para a escola, bem perto do portão de entrada, foi atingida por uma bala perdida, resultado da troca de tiros de marginais com policiais.
Levada ao hospital, não resistiu ao ferimento.
A mãe quando soube do ocorrido ficou deveras consternada e até mesmo fora de si, como soe acontecer com a grande maioria das mães que perdem seus filhos e, baseada nesse infortúnio leu a poesia abaixo:

LAGRIMAS

Às vezes rolam pelo rosto afora,
Nas desventuras por alguém sofridas,
Principalmente quando são queridas,
As criaturas pelas quais se chora.

Mas há quem chore sempre e a qualquer hora,
Por um simples senão nas suas vidas:
São muitas vezes lágrimas fingidas...
Não vão ao coração, só estão por fora.

A lágrima pesada a mais dorida,
A mais desesperada que me ocorre,
Que chega às vezes acabar co’a vida,

De quem na sua face ela se escorre,
É a lágrima de dor por mãe vertida,
Quando um filho doente ou quando morre!

E, como, “NÃO HÁ BEM QUE SEMPRE DURE, NEM MAL QUE NUNCA SE ACABE”, Neneca, com o passar do tempo, foi se conformando com o sucedido.
Plantou uma roseira na sepultura da Nereida e todas as manhãs, a regava com suas copiosas lágrimas... A roseira foi crescendo, crescendo e, numa bela manhã primaveril, mostrou-se completamente florida... Mas ao invés de rosas rubras, como as das suas congêneres, apresentou-se com rosas vermelho-negras, em tom melancólico tal qual, o sofrimento daquela pobre mãe desventurada.

Nota: Ambas poesias já foram publicadas: MÃE SOLTEIRA no livro FLORES DE OUTONO, do próprio autor e LÁGRIMAS, neste blog.

3 comentários:

Emilene Lopes disse...

Bela história, pena tão triste...O pior é que esse tipo de história se torna cada vez mais real em nosso meio..
Bjs
Mila

Mada disse...

Quase sempre lágrimas são de dor,
Umas menos, outras mais,
Mas são pingos de amor,
Dos olhos que transmitem paz!

Bjs

Gisis disse...

Lágrimas de dor ou de alegria...São como temporais que rolam em nosso rosto.Lindo poema.Abraços Giselda